O perdão não é para o seu algoz, é para você mesmo.
Sim. Tenho certeza que você estranhou o título deste artigo. Eu também o teria feito há alguns anos, quando ainda me via escrava de uma série de preceitos e conceitos. Eu, assim, como provavelmente você também, acreditava que perdoar era uma atitude, um sentimento, dos mais nobres e praticamente inacessível aos mortais comuns.
Hoje, estou certa de que além de ser sim, um sentimento, é uma prática, um exercício e que pode ser aprendido por qualquer pessoa. Contudo, mais que isso, perdoar é uma necessidade…
Desde a tenra infância, fui doutrinada a acreditar que a cada treta a que eu era submetida – justa ou injustamente – tinha invariavelmente que seguir algumas instruções:
- Investigação – deveria haver um trabalho investigativo, para saber se a criatura causadora dos meus dissabores tinha se arrependido. Ou o perdão não tinha valia. “Perdoar é para aqueles que querem se perdoados…” Tá bom então…
- O ato em si: compunha-se em ir ao encontro da fonte causadora da minha dor e, do alto da minha dignidade, atirar-lhe o meu nobre perdão na cara. Quisesse o indivíduo ou não.
- Reconciliação: “Volta lá e abraça *fulano*”. Isso para mim era a maior das misérias… Sair do meu pedestal de dignidade – pós perdão – e fazer as pazes com o ser… Muitas vezes desejei a morte lenta e dolorosa ante situações assim, mas ela não veio… Ainda bem…
Felizmente, depois de muitos anos de terapia, choro e ranger de dentes, aprendi o que é o perdão, como pô-lo em prática e por que é uma necessidade…
Perdoar é uma atitude, uma ação, que em nada tem a ver com o “perdoado”, mas com aquele que perdoa. Quando somos atingidos pelos atos alheios, é mais do que natural, é humano, ficarmos tomados por todo tipo de sentimento mal qualificado. Ora, fomos vítimas de algo que, se não nos prejudica efetivamente, no mínimo, nos aborrece, podendo tirar o sono. E, exceto avatares, masoquistas e mentirosos, ninguém aprecia passar por esse tipo de constrangimento. O esperado até, é que despejemos nossa ira em cima de alguém que nos faz mal, em qualquer situação. Mas isso também não é bom. Muito menos para nós mesmos…
Então, o primeiro passo é sair do papel de vítima. Sei que é chato ler isso, mas é verdade. A franca maioria das pessoas adora encenar o pobre miserável, o coitadinho, seja com o intuito de chamar atenção, atrair empatia alheia, ou só por autocomiseração mesmo.
#Dica1: Você nem ninguém é vítima. Está certo, a pessoa não foi legal com você, te arrumou uma treta gigante, te magoou, prejudicou de alguma forma. Você foi alvo de alguém mal intencionado, provavelmente, mas incorporar a pobre vítima não vai ajudar em nada. Só vai aumentar o sentimento negativo, te prender ao passado, afastar os outros de você (convenhamos, ninguém atura o coitadinho muito tempo, é chato!) e intoxicar o fígado. Problema, dor, revolta, mágoa, raiva, ódio, seja lá o que for, não é para ser cultivado, é para ser eliminado! Portanto, DESAPEGA. Por mais que você tenha razão e o candidato a perdoado mereça a forca, esforce-se em superar. Vista-se do que sobrou da sua dignidade e mostre que você é muito maior que isso.
#Dica2: Remoer raiva e planejar vingança são como segurar carvão em brasa. O primeiro a se queimar é você mesmo. Sei que parece fácil da minha parte falar assim. Todavia, creia: eu já passei por isso. Já fiquei muitos anos segurando carvão em brasa, com as mãos, os braços, a mente e o coração em carne viva, ao ponto do amortecimento, esperando que a criatura que me fez mal, fosse queimada. Anos… Em vão… A única pessoa atingida fui eu mesma. Não obstante, quem aprendeu a maior das lições, também fui eu… Totalmente natural sermos invadidos pelo sentimento de vingança, mas acredite, em lugar de investir tempo e queimar neurônios pensando em como proporcionar uma vingança à la Bette Davis, invista seu tempo em fazer algo bom, útil e prazeroso para você mesmo.
#Dica3: Liberte-se. Você tem toda razão, quem sou eu na fila do pão para dizer que seu sentimento não é genuíno e que a criatura que aprontou com você, não merece ser fatiada e jogada aos lobos… Mas esse sentimento é como carregar pedras. Imagine que desde que aconteceu o fatídico episódio, você tivesse pego um saco com 100kg de pedra e o levasse nas costas a todo canto? Eu consigo sentir o peso nos seus ombros, o incômodo que é carregar essa mágoa toda, como se fosse parte do seu ser, como se você não pudesse se libertar dela. Mas você pode. Esse é o pulo do gato do ato de perdoar. Quando você simplesmente decide perdoar o outro, queira ele ou não, mereça ele ou não, saiba ele ou não, quem é libertado é você. Você. Que se desobriga a carregar o saco de pedras para todo lado. Calma, eu sei que não é fácil, é desafiador, porém, totalmente possível. Volta lá no início do texto e lê de novo onde eu disse que perdoar é um exercício. Exatamente. É uma prática. É esvaziar-se do sentimento de vítima, da mágoa, da raiva e dar lugar à esperança, ao amor próprio. Afinal, quem está carregando as pedras é você… Ninguém vai levar no seu lugar.
#Dica4: Esqueça o outro. Esse negócio de que o outro precisa se arrepender, precisa querer ser perdoado, merecer o perdão é papo furado. Balela. O perdão é para você. O causador desse perrengue sequer precisa saber que perdeu toda a importância. O perdão é dentro de você. Não há necessidade de verbalização, encenações teatrais, nada disso. É uma decisão sua, pronto. Faça e ninguém precisa saber. E outra dica, quando vierem os inconvenientes de plantão atiçarem o fogo da vingança (que a essa altura já vai estar extinto!), ignore-os. De gente assim, eu sinceramente, prefiro manter distância. Então, tome uma decisão hoje, agora: perdoe quem te fez mal. Vai te fazer um bem enorme.
#Dica5: Perdoar sim, esquecer jamais. Vamos com calma com esse andor porque o santo é de barro. Ninguém aqui falou para você voltar lá e ficar “de bem” com a criatura. Sair distribuindo abraços e ir tomar cerveja no bar da esquina com ela. Perdoe dentro de você, transmute os sentimentos negativos, abandone o saco de pedras, mas fique esperto: perdoar não é ser tolo e muito menos confiar de novo. A menos que você queira. Caso você sinta que a pessoa realmente se arrependeu e suas vísceras te dizem que você pode confiar de novo, tranquilo. Vai fundo. Mas é bom estar consciente que perdoar não é confiar de novo e muito menos se obrigar a uma convivência indesejada. É uma atitude, uma necessidade e uma libertação.
Espero sinceramente que depois de ter lido esse texto, você reavalie se vale a pena continuar carregando pedras, segurando carvão em brasa…
O perdão é libertador e te dá asas…